José Delmo
Certa ao vez, ao participar de uma audição com objetivo de fazer um curso de Teatro no Japão, meu amigo Alfredo Nascimento, ao ser abordado pelo instrutor sobre o que ele sabia fazer, disse: "Cantar, dançar, tocar piano, falar japonês, trapézio!" O instrutor respondeu: "Você vai comigo para o Japão!".
Ao chegar em Tóquio, o diretor o colocou num Teatro lotado, criou uma cena e pediu que ele tocasse uma música enquanto ocorria o esquete. Até aí tudo bem. Só que, Alfredo, não sabia tocar piano, dançar ou cantar. Mesmo assim, ao ver o instrutor tocar o piano, memorizou o som e o movimento dos dedos e "tocou"! Alfredo Nascimento, esse maluco inteligente, é ATOR!
O ator é o cara capaz de ser qualquer um. Mesmo um grande músico, sem nunca ter tocada um instrumento qualquer. E, tudo passa pela Preparação Corporal, não para encontrar um modelo corporal nem impor formas teatrais preexistentes. Como bem afirma Jacques Lecoq, a Preparação Corporal "deve ajudar cada um a atingir a plenitude do movimento justo, sem que o corpo esteja "em demasia", sem que ele parasite aquilo que deve transportar. Ela se apoia, então, primeiramente, numa ginástica dramática, na qual cada gesto, atitude ou movimento é justificado. Emprego exercícios elementares, como balançar os braços, flexões anteriores ou flexões laterais do tronco, divisão do peso nas pernas, enfim, uma boa quantidade de exercícios geralmente utilizados na maioria dos aquecimentos corporais, mas dando-lhes um sentido".
Foi isso que o ator José Delmo - meu convidado da Aula 10 - transmitiu para os alunos. A princípio os alunos começaram a realizar o exercício de uma forma mecânica, simples, até que aos poucos eles foram descobrindo seu percurso. Ao ampliar os movimentos para ir aos seus limites corporais (como o fato de esticar-se ao máximo) eles tentavam ocupar o maior espaço possível.
Delmo, logo em seguida, tentou imprimir a dinâmica dramática no jogo: de um lado, o momento inicial, em extensão, pouco antes de o tronco ser levado pela queda; de outro lado, aquilo que marca o fim do movimento, o retorno do tronco e dos braços à posição vertical, "quando o corpo se encontra novamente em extensão e quando o movimento vai morrer, imperceptivelmente, na imobilidade (a flexão do joelho, por exemplo).
Ao propor o exercício do "acordar" para ir a aula de Teatro, terminando quando todos descessem do palco e sentassem na plateia, foi um momento dramático forte, entendido por poucos. Como bem afirma Lecoq: "A suspensão que precede a partida insere-se na dinâmica do risco, da queda, e traz um sentimento de angústia, que surge de maneira muito evidente". Como, acordar, fazer o que eu tenho que fazer durante todo o dia e à noite ir à aula de Teatro em apenas dez minutos?"
"Em estado de repouso, deitados no chão e relaxados, peço aos alunos que "despertem pela primeira vez". Uma vez desperta a máscara, o que ela pode fazer? Como ela pode se movimentar?"
(Jacques Lecoq - O Corpo Poético, uma pedagogia da criação teatral)
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