Nunca precisei usar o “ponto” no Teatro. Talvez porque ele já não estivesse mais em atividade quando comecei a encenar ou porque o considerava uma muleta. A verdade é que ele foi criado no século no século XVIII e só existe hoje de maneira institucional na Comédie-Française, talvez por causa do abandono do sistema de alternância e dos palcos italianos.
O ponto ajuda os atores em dificuldade, falando em voz baixa, soprando, articulando bem, mas sem gritar, a partir dos bastidores ou do buraco, mascarado por um nicho (o “capô”) no meio e na frente do palco. Sopra-se a palavra ou, se o ator se embaralha na frase, a frase seguinte, tomando cuidado com os tempos de extensão variável para não confundi-los com lapsos de memória.
Entretanto, sempre fiz com que os atores fossem “pontos” uns com os outros. Assim, ao invés de criar muletas, criava “pontes” que permitia ao elenco mais segurança no palco. É fato que o bom ponto deve saber, ao observar os atores, antecipar o erro ou a dificuldade e interferir no momento exato. O problema ocorria quando ele entrava na hora errada ou não permitia o tempo necessário para o ator falar seu texto.
Chamei de “pontes” a criação de subtextos que antecipavam os textos dos atores. Explico: se o ator “X” tem a seguinte frase:
“- Seja qual for seu problema, não estou aqui para resolvê-lo!”
E ele não o diz, abrindo espaço para o famoso “branco” (lapso de memória temido pela maioria dos atores) e a frase é importante para a compreensão da frase seguinte do outro ator que ele está contracenando, a “ponte” entra em ação pelo ator que percebeu o lapso do companheiro de cena. Assim ele diz uma nova frase (subtexto) que não estava no texto para disparar a frase do outro:
“- Eu estou cheio de problemas!”
“- Seja qual for seu problema, não estou aqui para resolvê-lo!”
Pronto. O texto corre livremente. A “ponte” é o toque, a deixa subentendida que passa despercebida pela plateia. É claro que isso exige treinamento e técnica.
Outra artimanha (até hoje ainda é usada) no Teatro são as dálias. Uma espécie de cola usada pelos atores escritas em pedaços de papel e distribuídas pelo cenário. Há um caso interessante e engraçado do ator Ambrósio Fregolente, ao atuar em um programa de teatro ao vivo, na antiga rede Tupi de Televisão, no Rio de Janeiro (reconheceu sua dificuldade em decorar os textos e, para evitar constrangimento, pendurou suas falas num vaso de dálias instalado bem próximo da cena).
Como as folhas de papel e as flores não faziam parte do espetáculo, o contrarregra, desavisado, tirou tudo dali, inclusive o vaso, deixando o ator completamente desesperado com o programa em andamento e sem poder continuar a encenação. Fregolente grita:
- “Onde estão as minhas dálias?”
Desde então, o vaso de dálias é usado em espetáculos teatrais e nos programas de televisão, onde, escondidas atrás das flores, ficam camuflados "as colinhas" dos atores. Assim, mesmo sem estar escondido entre vasos e flores, esses pedaços de papéis ou de cartolina, que ainda socorrem os atores em cena, receberam o nome de dália e, até na era dos pontos eletrônicos, não foram totalmente aposentadas.
Fontes:
Sobre o Ponto: Dicionário de Teatro, Patrice Pavis;
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